A palavra Xerox pra você pode significar só uma cópia de uma folha de papel. Mas ela também uma empresa antiga e revolucionária que é o tema da semana na série de história da tecnologia.
Chegou a hora de você conhecer a origem dessa técnica, como a empresa evoluiu e porque ela perdeu a oportunidade de ser uma das maiores do mundo.
A união faz a força
A história da Xerox tem dois começos. Como assim? Peraí que a gente explica. A primeira parte começa em 1906, com a fundação da The Haloid Photographic Company em Rochester, Estados Unidos. É a mesma cidade da Kodak e não é coincidência, já que ela se especializou em fabricar filmes e equipamentos fotográficos. Só que a empresa era no máximo média e sobreviveu por pouco à Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial.
Um cartaz antigo da The Haloid Photography Company.
Agora vamos pra outubro de 1938, quando o físico e advogado Chester Carlson produz a primeira imagem xerográfica do mundo. A técnica também é chamada de eletrofotografia, e revolucionava até as fotos comuns. Isso porque ela permite que a gente copie uma foto, documento escrito ou ilustração sem ter que reproduzir o processo.
O segredo? Gravar uma mensagem usando um pó especial em uma folha de papel, tendo como base uma lâmina de vidro com desenho em tinta e uma chapa de zinco.
A inscrição 22 do 10 de 38 Astoria, data e local do experimento, foi o primeiro xerox, que ainda nem tinha esse nome. Carlson demorou 10 anos até achar alguém interessado em comprar a tecnologia e produzir um aparelho que reproduzisse isso em larga escala. A nova dona era a Haloid Company, sob o comando do visionário executivo Joseph C. Wilson.
Como funciona?
O processo evoluiu, agora com uma camada fina de substâncias como o selênio como material fotocondutor, aproveitando eletricidade estática e o princípio de que cargas opostas se atraem. A chapa metálica abaixo do vidro em que fica o documento original e a própria folha de papel ficam com carga positiva.
Um exemplo básico do funcionamento da fotocópia, com as bobinas esquentando com a ajuda da luz.
Já o toner, que é um pó formado por partículas de plástico, é de carga negativa. Esse conjunto todo recebe luz, e as partículas grudam na folha, que tem uma carga positiva ainda mais forte. Rolos de teflon aquecem o conteúdo do toner e fazem ele grudar no papel. É por esse passo final que a folha do xerox fica quentinha na sua mão.
Combinando a verba e o equipamento da Haloid e a invenção de Carlson, a primeira XeroX Copier com os dois X maiúsculos é lançada em 1949. O sucesso do aparelho foi só modesto, ele era lento e fazia muita sujeira. Mas tinha potencial de sobra.
A primeira das máquinas da Xerox.
Ah, e foi nesse ano que veio a palavra xerografia. Quem bolou isso foi um professor universitário consultado pela Haloid. O termo deriva das palavras em grego para “escrita seca” e até aqui no Brasil virou tanto sinônimo de fotocópia quanto um verbo, o xerocar.
A revolução da 914
A Xerox lança nos anos seguintes uma copiadora de microfilme, a Copyflo. Mas o sucesso é mesmo a Xerox 914, de 59. Essa foi a primeira fotocopiadora totalmente automatizada do mundo, rápida e econômica, mas de difícil manutenção. Esse produto é considerado um dos maiores sucessos comerciais individuais de todos os tempos, e revolucionou a cópia de livros e documentos. O nome vem do tamanho máximo das folhas copiadas, 9 por 14 polegadas.
A lendária e enorme Xerox 914.
De carona no sucesso, a empresa lança mais modelos nos anos seguintes. De 64, a Xerox 813 foi a primeira copiadora pra ser usada em cima da mesa, já que a anterior era enorme e ficava direto no chão. De 66, a Xerox 2400 foi batizada com o número de cópias que fazia por hora, um recorde na época. Ela é a primeira com alimentador automático de papel.
Tudo dava tão certo que a Xerox abriu um enorme centro de pesquisa e fabricação na cidade de Webster pra atender a demanda. No fim da década e com capital aberto, ela compra pequenas empresas de tecnologia e expandir a linha de produtos para além das fotocópias.
Um dos berços da tecnologia
Em 1970, foi inaugurado o lendário Xerox Palo Alto Research Center, ou Xerox PARC. Esse centro de pesquisa foi um dos mais importantes da história da tecnologia, e nele surgiram nada menos que: computador pessoal, a interface gráfica de usuário, o padrão Ethernet, o mouse, a diagramação de documentos de texto, um software de criação de imagem que é avô do Paint e muito mais. Mentes incríveis foram formadas por lá.
E foi em uma visita ao PARC que Steve Jobs viu essas novidades e levou as ideias pra Apple aprimorar e lançar. O que mais impressionou era a interface, ou seja, ícones e janelas pra executar tarefas no computador. O próprio Jobs disse em entrevista que a Xerox não fazia ideia da revolução que tinha nas mãos, e se aproveitou da ingenuidade ou falta de interesse.
A história mais difundida é que a Apple roubou na cara dura, mas na verdade a visita foi paga por um acordo de compra de ações. Se foi sacanagem ou não, aí vai de cada um. A Xerox processou a Maçã uma década depois, mas não conseguiu a indenização que gostaria.
O PARC mantém o bom trabalho até hoje, mas funciona de forma mais independente.
De lá, saíram dois computadores. O primeiro é o revolucionário Xerox Alto, de 73, considerado o primeiro computador pessoal. Ele trazia um quase inédito mouse, sem contar o sistema operacional e a interface gráfica. Ele virou um fenômeno no Vale do Silício, mas não chegou a ser vendido. Quem foi pras lojas foi o Xerox Star, de 81, e o Daybreak, de 85. Eles eram caros e só depois a gente descobriu que a Xerox tava tão adiantada.
O Xerox Alto.
Mas se ela saiu na frente, era tão boa assim e tinha criado todas as tecnologias, por que a Xerox não investiu em PCs? São vários motivos. Os modelos dela não fizeram um sucesso animador, produzir um computador barato na época era difícil e era preciso focar demais nesse segmento pra dar certo, como Apple e IBM.
O Xerox Star.
Então, a Xerox resolveu jogar seguro e deixou de embarcar nessa indústria que deixaria ela ainda mais gigante do que já era. Ou seja, se ela tivesse mudado de ideia e fabricado tudo o que saía do PARC, a gente teria modem, PC, mouse, monitor, tudo hoje com a marca da Xerox. Mas não aconteceu.
Uma marca incansável
Voltando pras copiadoras, a Xerox apresenta mais novidades, como autoduplicação e controle de brilho. Em 75, sai um comercial histórico. A propaganda mostra o irmão Dominic apelando pra uma copiadora na hora de copiar manuscritos num monastério. Ele caiu nas graças da galera, virou garoto propaganda e foi até revivido 40 anos depois, pra mostrar novas tecnologias.
essa década, saiu a Xerox 6500, a primeira fotocopiadora colorida da empresa. E a impressora a laser também foi inventada pela Xerox. Ela nasceu no PARC por Gary Starkweather, que modificou uma copiadora e adicionou uma nova tecnologia.
A primeira impressora a laser da Xerox.
Ela foi colocada no mercado anos depois como a Xerox 9700, capaz de imprimir 120 páginas por minuto e destinada só para o mundo corporativo. Era 1977, um pouco tarde, mas ainda causando impacto e rendendo muito. No ano anterior, a última unidade do clássico 914 foi produzida.
Pedras no caminho
Mas a década não acaba nada bem pra Xerox. Ela sofre um processo de um órgão regulador nos Estados Unidos e toma uma punição antimonopólio pesada. A empresa é obrigada a licenciar várias de suas patentes pra competidoras e permitir que usuários comprem toners e serviços de manutenção dessas rivais.
Ela perde uma fatia imensa de mercado para concorrentes que antes não existiam ou não ameaçavam tanto, como a Canon, Epson, IBM, Kodak, HP, Ricoh e muito mais, todas com produtos diferenciados e preços competitivos.
Nos anos 80, ela precisa se reinventar e expandir pra outros mercados e passa a prezar mais por qualidade que quantidade. Em expansões, uma das soluções foi em máquinas de escrever com a Memorywriter, um modelo elétrico com memória interna e telinha para correção de erros antes das letras irem ao papel. Pra economizar, ela vende algumas subsidiárias.
A Memorywriter.
Os anos 90 também são cruéis. Ela muda a logo pra um X vermelho com uma ponta pixelada, com o slogan “The Document Company” pra mostrar que é uma empresa moderna, mas isso não é o suficiente. Ela também subestima o mercado das impressoras de tinta e perde muita competição por causa disso. Os CEOs Paul Allaire e Richard Thoman, que comandaram a Xerox nos anos 80 e 90, culpam um ao outro pela falha na transição pro digital.
Sem desistir
Por outro lado, a Xerox é pioneira em serviços de produção e publicação com o DocuTech. Essa tecnologia combinou escaneamento em alta resolução, renderização de imagem em baixo custo e ótima velocidade de resposta em um só lugar. Você manda imagens remotamente pro aparelho, armazena por lá, faz edições, compartilha com a rede local e manda imprimir.
A plataforma DocuTech 135.
Essa é considerada uma revolução tão grande quanto as primeiras copiadoras e ainda inventou a indústria da impressão sob demanda, que em que cópias de livros ou revistas são feitas em grande escala, mas só na medida em que são encomendadas e podendo sofrer alterações ou correções gerando economia. O nome foi trocado por Nuvera em 2005.
Nos irregulares anos 2000, mais trocas de comando, com o saldo ficando positivo aos poucos e uma série de linhas no mercado. Estão na lista as famílias DocuColor, Phaser e ColorQube, as impressoras digitais iGen e a série Impika, de uma startup comprada em 2013.
Desde 2016, os negócios da Xerox fora de documentos e impressão viraram uma marca chamada Counduent.
Só que a imagem dela nunca mais será a mesma depois de junho de 2002. A empresa admitiu irregularidades no balanço das receitas, e essa fraude chegou a 2 bilhões de dólares em manobras fiscais. Aliás, cerca de um terço desse valor foi maquiado em atividades aqui no Brasil! A Xerox pagou 10 milhões de dólares de multa.
A atual logo da empresa é em minúsculo e com uma esfera lateral com um “X” branco no meio.
…
A Xerox continua no ramo de copiadora, impressão, escâner, multifuncionais, email e até fax, tanto pro consumidor final quanto em escala comercial. Só que faz tudo isso hoje de forma bem mais discreta, com muito menos impacto. Mas claro que ela ainda é respeitada por todo o legado, já que realmente revolucionou o mundo com as fotocopiadoras.